Poema à mãe
No mais fundo de ti,
eu sei que traí, mãe!
Tudo porque já não sou
o retrato adormecido
no fundo dos teus olhos!
Tudo porque tu ignoras
que há leitos onde o frio não se demora
e noites rumorosas de águas matinais!
Por isso, às vezes, as palavras que te digo
são duras, mãe,
e o nosso amor é infeliz.
Tudo porque perdi as rosas brancas
que apertava junto ao coração
no retrato da moldura!
Se soubesses como ainda amo as rosas,
talvez não enchesses as horas de pesadelos...
Mas tu esqueceste muita coisa!
Esqueceste que as minhas pernas cresceram,
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração ficou enorme, mãe!
Olha - queres ouvir-me? -, às vezes
ainda sou o menino
que adormeceu nos teus olhos;
ainda aperto contra o coração rosas
tão brancas como as que tens na moldura;
ainda oiço a tua voz:
"Era uma vez uma princesa no meio de um laranjal..."
Mas - tu sabes! - a noite é enorme e todo o meu corpo cresceu...
Eu saí da moldura,
dei às aves os meus olhos a beber.
Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas...
Boa noite. Eu vou com as aves!
Diário de um fumador
Apenas o desespero na forma de palavras
26 de agosto de 2008
Parabéns Mãe
Eugénio de Andrade
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1 comentário:
Eugénio de Andrade, um dos meus poetas preferidos, e este poema.... tem tanto!
Xana
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